Olá! Vamos metaforizar?
Imaginem-se no meio de um terrível desastre natural. Um descontrolo imenso à vossa volta, a natureza a clamar o seu terreno, destruição maciça sem qualquer controlo, um crescendo de devastação e terror, a alma em alvoroço, o corpo inteiro em pânico. Quando estamos no meio de uma catástrofe, apenas conseguimos sentir desespero, medo, terror, ser empurrados ao capricho das explosões bruscas pelas quais nos sentimos devorados...
Se surgir a oportunidade de nos afastarmos, ao ponto de ver este inferno de fora, mas ainda muito próximos, iremos sentir o mesmo espectáculo de horror, sofrer muita tensão e receio, mas sentir-nos-emos com alguma esperança de não ser engolidos pelo mesmo e desejar poder escapar-lhe.
Se formos capazes de sair daquele cenário dantesco, observando a uma distância segura, seremos capazes de ver o mesmo acidente terrível, por inteiro. Perceberemos que não é interminável, que pode ser contido e que o seu temperamento negro, tempestivo, agressivo e implacável continuará, contudo
seremos capazes de ver o seu engolfamento assustador a decorrer, percebendo que temos alternativas para o combater, para gerir as consequências, para nos reedificarmos e socorrer qualquer tragédia.
seremos capazes de ver o seu engolfamento assustador a decorrer, percebendo que temos alternativas para o combater, para gerir as consequências, para nos reedificarmos e socorrer qualquer tragédia.
Este é o momento em que conseguiremos organizar a nossa mente, ter clareza, compreender que é uma calamidade e que, mesmo afastados, ela prossegue. Contudo, agora seremos capazes de agir. E de pedir ajuda para a resolver e sanar, mais rapidamente e em segurança. Quando estamos sorvidos pela intensidade do que acontece, apenas conseguimos sentir sofrimento, desesperança e reagir de forma pontual, ao que nos vai sendo arremessado contra nós. Quando começamos a ganhar alguma distância, cresce em nós a esperança de que conseguiremos ultrapassar este episódio difícil e sair dali. Quando, finalmente, vemos tudo ao longe, sentimos alívio, confiança e passamos a ser capazes de colocar em acção ferramentas para ajudar a combater este mal, que nos parecia impossivelmente monstruoso.
Durante qualquer evento negativo intenso, seja um incêndio doméstico, uma discussão demasiado acessa, uma dura luta de rua, um acidente grave ou um episódio de bullying, o único que desejamos é afastar-nos, sentirmo-nos seguros. Se o nosso corpo sabe que o deve fazer, já que, fisicamente afastados, teremos mais competência para superar e vencer qualquer desafio, porque que é que a nossa mente, por vezes, cisma em manter-nos aprisionados em cenários de guerra? A perspectiva é algo de muito poderoso. Porque o momento pode ser precisamente o mesmo, a realidade pode ser terrível, mas a distância que temos à mesma, é o que define a forma como a sentimos e o que conseguimos fazer em relação a isso. Se estivermos numa encruzilhada não sabemos que caminho escolher, mas se virmos os mesmos caminhos de cima, já será muito mais simples saber por onde queremos ir porque passamos a ter mais conhecimento e sentirmo-nos mais empoderados e amparados.
Se estivermos a meio de uma crise, plenamente envolvidos, achamo-la interminável, insuportável e impossível de a considerar de outros ângulos. No entanto, convido-vos a escrutinar as vossas memórias. Estarão, seguramente, repletas de situações desafiantes onde acreditaram que não iriam aguentar ou ser capazes de ultrapassar. E, apesar disso, aqui estamos todos. Sabemos que, perante provações custosas, navegamos com as ferramentas possíveis na altura, e essas, por vezes, são parcas.
A distância provê-nos mais instrumentos emocionais,
mais mecanismos de defesa ajustados, mais coragem, mais ânimo,
mais segurança e mais esperança, logo, mais acção!
mais segurança e mais esperança, logo, mais acção!
Desta forma, não será relevante e pertinente ter um diálogo a sério com a nossa mente, emoções e cognição, e começar a reagir psicologicamente da mesma forma como reagimos no quotidiano? Se virmos um leão esfomeado, o mais certo é querermos por-nos a milhas. Então e permitir pensamentos obsessivos sobre um episódio que nos aterroriza, mantermos um leão que nos quer comer, fechado dentro de nós, em que é que nos traz produtividade e serenidade? Além de nos condicionar sentimentos mais positivos como confiança e perseverança, ainda nos aprisiona num estado paralisante, diminuindo, não a capacidade de reagir mas a percepção sobre a mesma.
Gosto muito do filme "A Vida é Bela", acho fascinante a resiliência do Guido e a forma deliciosa como, em pleno horror do Holocausto, um pai consegue tornar a realidade devastante do filho em algo, não apenas aceitável, mas carinhoso, engraçado e esperançoso. É um exemplo incrível do que somos capazes de fazer, com a nossa mente. Confesso-me suspeita no poder que atribuo à nossa capacidade mental, mas, de facto, é absolutamente brilhante o que somos capazes de alcançar, quando nos propomos a isso. Em qualquer situação, se nos sentirmos bloqueados, viveremos em sofrimento e angústia constantes, numa prisão auto imposta. Contudo, se formos capazes de compreender esse mesmo momento como um degrau no nosso desenvolvimento pessoal, podemos escolher superarmo-nos. Aproveitar as inevitáveis adversidades, de um modo construtivo.
Anteriormente, referi que, se nos virmos perante uma catástrofe natural, não hesitaremos em chamar alguém para nos ajudar a combater a mesma. E fazemos bem, seguramente será bem mais rápido e eficaz. De igual modo, vale a pena ponderar em recorrer a alguém para nos auxiliar a analisar e ponderar sobre qualquer problema que nos esteja a perturbar. Um saco de carvão que pese 50 kg, pesará apenas 25 kg se alguém nos ajudar a carregá-lo, e não é por isto ser um cliché que é menos verdade. O mesmo se passa com o sofrimento, o peso emocional do mesmo pode ser dividido, partilhado. Além de nos dar a oportunidade de ventilar sobre o que sentimos e nos incomoda, conquistamos a enorme benesse de alguém nos mostrar novas perspectivas sobre a nossa dor. O que pode levar-nos a adquirir a tão desejada distância, que nos permitirá reagir-lhe de uma forma mais saudável e serena.
A última sugestão que deixo é, como sempre e já minha marca registada, usar e abusar do humor. Sou fã do humor, do negro, do claro, do colorido. Se estivermos embrenhados num momento intolerável, e tivermos a capacidade de ver o humor no mesmo, quem vence, somos nós. Uma gargalhada bem sentida tem o potencial imenso de nos inundar pelo quarteto da felicidade, dopamina, serotonina, endorfinas e oxitocina. Deixemos que estes neurotransmissores façam parte constante do nosso quotidiano, e nos ajudem a ter perspectiva sobre o que nos preocupa. Tudo tem um lado positivo, podemos não o conseguir ver no momento (o que não vos impede de aprender mais sobre o mesmo aqui), mas uma mente calma terá a segurança e a distância necessárias para o ver. E para podermos sorrir com vontade, felizes por sermos resilientes, ao manter doce uma vida, ocasionalmente, amarga.
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